12 de janeiro de 2021

Reencontro de pátrias

Ah, que doce mais doce: amigo meu, antigo como o vento, voltou a escrever em suas paredes. Que sorriso profundo me habita, que brilhar dos olhos me toma, que eriçar dos pêlos da minha nuca. Meu coração bate mais feliz, porque nesta Terra, depois de longa contusão, voltou um espírito a dançar — suas letras são suas pernas. Mesmo quando dói, quando o joelho lhe arranca a felicidade e o cansaço a preenche por inteiro — perdoa-me, caro Polter Geist, se parece que eu fico feliz com sua miséria: é que eu te amo o nanquim, eu te amo as penas, eu te amo os parágrafos e as palavras tristes. Perdoa que te ler seja o meu encanto.

Desvirginar-se

Freqüentemente nos encontramos perdidos dentro de nós mesmos — e, para quem é grande e complexo, encontrar o caminho de volta é especialmente difícil. Como em qualquer labirinto que se preze, não é factível memorizá-lo por completo e, ainda que fosse, tanto mais difícil seria quanto maiores nos tornássemos. Em vez disso, devemos criar métodos genéricos de tomada de decisão, estratégias suficientemente inespecíficas que nos conduzam de volta à luz — como quem caminha na mata fechada, devemos aprender a identificar nossa fauna e flora interior, perceber as direções em que fluem nossos rios, atentar às pegadas que anteriormente deixáramos em nossa lama, aprender a se orientar pelo vento e pelas estrelas; enfim, devemo-nos tornar íntimos de nós mesmos e sagazes contra nossas próprias armadilhas. Acima de tudo, devemos evitar cair dos penhascos, comer das plantas venenosas, andar em círculos. Até hoje, de todas as técnicas de intra-navegação com as quais me deparei, a mais útil de todas continua sendo --- seguir a abundância! A natureza, inclusive da pele para dentro, procura sol, expansão, exorbitância, diversificação, domínio, excesso — até mesmo os desertos desejam crescer! — e cabe a nós, bandeirantes de nós mesmos, excursores do espírito, bem-aventureiros do cosmo, jogadores da selva evolucionária: crescer! Sem crueldade nem consciência, guiados por pura maximização energética, devemos nutrir, medrar, brotar, desabrochar, estender, possuir, entesourar, engrandecer. Em caso de dúvida, buscai o colorido, o borbotoante, o úmido e o luxurioso: produzi o espaço para abrirdes as asas, caminhai com altivez, tende coragem em cada passo, certeireza no olhar, confiança no viver. Assenhorai-vos de vossa --- perfeição!

2 de janeiro de 2021

Suspiros dolorosos

Odiamos quem só faz reclamar, mas odiamos mais quem sequer reclamar sabe.