8 de dezembro de 2022
Afrouxar dos punhos
5 de dezembro de 2022
Água nos olhos
Queria sentir sua tristeza sem inibições seletivas. Tinha saudades de se banhar nos próprios sentimentos, longe da culpa e da vergonha — essas capas de chuva da existência. Com as quais não se molha, é verdade, mas tampouco se brinca. Tampouco se chora.
Queda
Entenda... Ele não lia um livro há anos. Tinha engordado 20kg. Já não tinha mais fio nem coração. Pensava devagar, como se tivesse pernas desalmadas. Definhava como os velhos do passado. Em 30 anos, tinha subtraído três séculos. Cairia.
Epitáfio
Sua tristeza o compunha como o hidrogênio o sol. Tinha desaprendido a crescer e, na falta de luz e água, murchava cada dia mais esplêndido. Casara-se com o próprio medo e, paralisado, vomitava na tela a impotência branca — inodora e infeliz. Morreria depois de conhecer a felicidade, envenenado de memória e dor. Chorar já não sabia mais. As estrelas devolviam-lhe a negligência na qual se banhara. Não havia prateado nem dourado. O único brilho era a iridescência de sua gordura, que do seu cu fazia um arco-íris irônico e cruel. Como se Deus troçasse de sua existência, desafiando-o a reagir. Dali nada viria, é claro. Nunca veio. A única tônica havia sido a covardia e a desistência. E pereceria assim, nadificado, entregue sem protesto à Preguiça do espírito. Nunca se casaria, pensou. Permaneceria para sempre só, sem voz e já quase sem cabelo. O coração gelaria e não viraria sequer fóssil. De amor passado e expirado ele se tinha matado por dentro. O nó na garganta amarrava-o a um passado que ele presentificava por desespero. Foda-se o sorriso. Suas últimas palavras foram feias e não serão jamais repetidas.