9 de janeiro de 2013

Pela legitimação dos vícios

Ao Sr. Deputado Federal Osmar Terra (PMDB-RS), que escreveu ao Jornal O GLOBO em 31 de Dezembro de 2012, página 17.

(Infelizmente não consegui manter a compostura até o fim desse texto. Uma pena, porque tenho coisas realmente importantes para dizer, e acho que ainda vai demorar alguns anos até que eu as consiga dizer de maneira satisfatória. Fica publicado aqui esse rascunho.)

Vou fazer o possível para me abster de comentar as inúmeras falácias cometidas ao longo do texto do Sr. Deputado e hei de me concentrar nos poucos argumentos de que se utilizou para defender sua rígida postura de enfrentamento às drogas. Não posso, no entanto, deixar de comentar a ignorância – ou talvez eu deva dizer: a maldade! – com que se confundem, no texto, correlação e causalidade. O exemplo usado pelo autor é, em si, prejudicial ao argumento dele: diz da Suécia, primeiro, que adotou medidas duríssimas de enfrentamento às drogas e, ainda, que lá “morrem assassinadas 30 vezes menos pessoas, proporcionalmente, que no Brasil”. Primeiro: não existe ligação causal entre esses dois fatos. Segundo: o autor segue: “Em outras palavras, se aqui tivéssemos as taxas de homicídio da Suécia, 48 mil pessoas deixariam de morrer assassinadas a cada ano”. Ora, mas como ousa?! Como ousa falar assim dessas mortes, como se fossem tão evitáveis, tão levianas, tão estúpidas como o senhor as descreve! É ultrajante a maneira como pretende colar no seu argumento a idéia de que enfrentar drogas combate homicídios. Se isso fosse verdade, pelo argumento que o senhor mesmo usou, nós – e todos os outros países que enfrentam as drogas, como a Suécia – teríamos taxas de homicídio baixíssimas! Nós não temos. Sabe por quê? Porque a sua correlação estúpida não é suficiente pra causar nada, por mais que você queira, por mais que você escreva bem, por mais que você distorça as coisas, por mais que você fale “em nome da ciência”.

Tirado isso do meu peito, vou tentar prosseguir ao único argumento usado pelo senhor deputado: a saber, que a dependência química leva a uma mudança estrutural definitiva no cérebro que faz com que os interesses e ações do indivíduo sejam direcionados na busca pela droga, em detrimento de todas as atividades produtivas. Segue-se disso que uma postura conivente para com as drogas seria contra-producente, pois geraria custos humanos (perdendo-se indivíduos produtivos) e financeiros (com gastos na área de saúde) extraordinários e irrecuperáveis para o país. O autor chega ao ponto de reconhecer que nosso cérebro possui um “mecanismo ancestral de sobrevivência”, localizado no “centro de recompensa”, e que todas as drogas, “do cigarro ao crack, passando pelo álcool e a maconha”, atuam sobre essa região, com as mesmas conseqüências danosas anteriormente descritas. Ora! Sabe o que mais atua sobre o centro de recompensa do nosso cérebro? Gordura, por exemplo. Bacon e cheddar. Sabe o que mais? Dinheiro. Sabe o que mais? Sexo. Sabe o que mais? Paracetamol. Não é possível que você tenha chegado ao ponto de admitir que todas as drogas são danosas (curiosamente, no entanto, o senhor não defende a criminalização do álcool nem do tabaco), sem com isso perceber até onde vão as limitações do seu conceito de Droga. Você argumenta, inclusive, que as grandes corporações, uma vez legalizadas as drogas, vão “traficar” os baseados. Ora, ora, ora! Pois sabe o que me irrita mais nisso tudo? Ninguém fala da criminalização das casas lotéricas! que corruptamente extorquem dinheiro da população: desviam-no, essencialmente, de bens muito mais essenciais. Adivinha também qual é a classe social que mais perde com isso? Acertou. Ninguém fala da criminalização dos aditivos químicos aos doces de crianças, ou dos joguinhos de iPod que exigem que você “compre créditos” pra continuar jogando. Ninguém fala da criminalização dos Arcades. E você sabe por quê? Porque seria ridículo. Ridículo como você. Você despreza o valor da área do cérebro que você mesmo diz ser importante estudar! Você, apesar de cientista, continua lutando contra inimigos internos, continua tiranizando partes de si, continua sendo um desprezador de si mesmo. É imensurável, eu digo, imensurável! a importância que a Raspadinha do Rio tem para a população. Ninguém nunca vai conseguir calcular a esperança que jogar na loteria permite a alguém que perdeu tudo. Ninguém nunca vai conseguir calcular o prazer de uma gelada depois do expediente abusivo do trabalho: e a calma que isso gera?! Imensurável! E o que falar dos poetas, viciados em amor? Dos amantes, dos viciados em sexo? Dos empresários, que “fazem o país crescer”, nitidamente viciados em dinheiro! O seu argumento é velho. Há séculos, há milênios a humanidade luta contra si mesma: e tem vencido! Você, que é médico, deve conhecer a história do ratinho: com acesso a um botão que ativava impulsos ligados à região do orgasmo em seu cérebro, ele apertou o botão até morrer de fome. Porque o prazer que sentia era, sim, mais importante que as suas funções vitais, era, sim, mais desejável. É incalculável a saúde que as drogas trazem ao país. Pois vocês continuam insistindo aí, feito papagaios, que “temos que lutar contra o alcoolismo”, que “temos de lutar contra o tabagismo”, que “temos de lutar contra o homossexualismo”, que “temos que lutar contra a violência”, mas vocês são todos tolos. Quantos não deixam de ser homicidas porque têm acesso à droga? Quantos não se deparam com a escolha entre bater nos filhos e fumar unzinho? Vocês são PODRES caso prefiram um abstinente covarde e violento. Vocês são podres, podres, podres. Um copo de álcool pode deixar mais calmo, pode fazer um melhor motorista. Ora, quer brincar de correlação? Por que não falamos dos EUA, que é o país que mais gasta na guerra contra as drogas e, veja só, é o país onde mais adolescentes matam em massa em suas escolas. DIVERTIDA essa brincadeira, né? NÃO. Seu merda.

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