20 de abril de 2013

Um texto escrito em caderno, depois de tanto tempo

“Por que não consigo ser como o Renato?”, eu perguntava a mim mesmo, enquanto o ouvia no carro. Por que eu não consigo ser singelo como ele?, por que eu não consigo fazer poesia desse jeito sincero e simples?

Eu invejo o Renato, mas não pela sua fama ou pela sua capacidade artística. Eu não consigo ser como o Renato, não consigo fazer poesia nu desse jeito, porque eu tenho vergonha. Eu invejo a falta de vergonha do Renato.

Uma vez a minha irmã disse “Puxa, eu tenho a impressão de que ele sofreu muito”, e isso me deixou com raiva, “Não, ele só viveu sinceramente!”, eu disse, “Ele não sofreu mais do que ninguém”. Ele não sofreu mais do que eu. Mas eu acho que é bem fácil ter a impressão de que o Renato conheceu a solidão, a tristeza e o amor.

Aí eu pensei: “Na verdade, é bem fácil imaginar que ele tenha sido órfão”. Num sentido profundo, metafórico, não no sentido literal. Mas é importante isso, porque a minha vergonha tem a ver com eu não ser órfão e, mais que isso, não poder ser órfão. Meus pais me matariam, se eu me tornasse órfão.

Eu tenho vergonha de me admitir triste e sozinho, porque isso seria uma traição às pessoas que deram a vida para a minha felicidade e estiveram sempre ao meu lado. Eu os ofendo com a minha tristeza, eu os ofendo com a minha solidão. Nem me pergunte sobre o ciúme (que tem, afinal, um pouco de tristeza e de solidão), pois este é o mais ofensivo dos sentimentos.

Eu invejo o Renato Russo, porque ele não tem vergonha de admitir que é órfão. Triste, sozinho e sedento de amor. Eu também. Eu também sou órfão. E não somos todos?

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