Viver é traçar linhas de areia no cosmos.
17 de dezembro de 2014
28 de novembro de 2014
A cada vez mais gay
Engana-se quem pensa que sair do armário é um acontecimento único na vida. Como se só houvesse um armário nos aprisionando. Sempre há alegrias maiores a sentir; sempre há armários maiores dos quais se libertar.
27 de novembro de 2014
Para o auto-conhecimento uma epistemologia mais sutil
Não se vence força inconsciente com montanhas de intencionalidade e deliberação. Precisamos de idiomas menos grosseiros para conversar com nossas entranhas.
26 de novembro de 2014
Onde ainda acreditamos em deuses
As idéias, para que sobrevivam, não basta serem boas.
Argumentar a favor da validade de uma idéia com base no fato de que ela continua ganhando adeptos e sendo repensada de novo e de novo -- é tao místico quanto acreditar que as pessoas boas têm mais chances de sobreviver que as outras, e tão idiota quanto achar que a sobrevivência das pessoas é indicativo da sua bondade.
Eu e você não acreditamos sequer numa justiça cósmica, divina - que dirá numa justiça humana! que dirá numa justiça filosófica!
Boas idéias morrem com a mesma frequência - e com a mesma sem-cerimônia - com que morrem boas pessoas. Quem quiser pensar faz bem em acostumar-se ao luto.
22 de novembro de 2014
23 de outubro de 2014
Amor parteiro
O caminho para entender um homem é sempre torto e desagradável, porque sobre suas complexidades recai um grosso véu acinzentado. Ao contrário das mulheres, cuja nudez até um cego pode ver, os homens exigem veemente intencionalidade: a nudez do homem não o habita naturalmente - precisa ser parida.
4 de outubro de 2014
Não confundir amizade com política
O prazer que você tira das conversas com esse amigo - - depende de vocês concordarem?
2 de outubro de 2014
Metáfora feminista
A mulher que decepa o pênis de um homem - - não é uma mulher. É um homem travestido.
1 de outubro de 2014
30 de setembro de 2014
Des-conto erótico
A prosa tem algo de explícito que a poesia normalmente esconde. Poeta fica horas encaixando sílaba, procurando rima, testando novas ordens de palavras, torcendo a gramática, inclusive fingindo beleza!, mascarando, pintando – não muito diferente de como as mulheres se pintam e cobrem, fantasiam, dançam, escondem e revelam.
A prosa, não. É mais masculina, mais direta, mais nua. Muitas vezes mais indecente e ríspida, insensível, boba, ingênua. A prosa ou te penetra ou não: é isso e acabou. A poesia, não. A poesia é uma mulher, nunca dá pra saber o que ela achou, o que ela quer de você, de quem ela gosta. Faz mistério, finge, embaralha, confunde, seduz.
Fale de sexo com um poeta e ele logo muda de assunto: vai falar de pescoço, de unha, de coxa, de olhar, de cantada, de feeling, de peeling, de perfume, de gozo, de gemido, de toque, de mão, de cama, de noite, de quatro.
Com um prosador, nada há do que falar: ou se penetra ou não. As margens são claras. Não é não. Nada de surpresas. Nada de invasões. Respeito é bom e eu gosto. Respeito ao corpo, ao indivíduo, à escolha, à ordem direta das palavras, ao sujeito-e-predicado, à conotação. (O prosador – tão prosaico é! – não sabe que o sexo é metáfora.)
O que pouca gente sabe é que, quando chega à noite, a Dona Prosa levanta da sua cama, como que enfeitiçada por uma música que vem lá de fora – de onde? de fora – levanta da sua cama, coloca um sapato (que já deixa de antemão preparado, antecipando a insônia que sempre vem), coloca um sapato, com cuidado para não acordar o marido, que dorme, que dorme, e sai. Sai à noite, pra ouvir o canto que vem do vento, do vento, que não vem de lugar nenhum, mas que vem, que vem. Caminha cambaleante, quase caindo, quase dormindo, sussurrada, bêbada?, não, mas certamente embriagada, ela anda, vai, tem que ir, os deuses a protegem, e ela vai, e vai e vai. O corpo leve, os olhos desfocados – não há medo, não há perigo – ela vai, acompanham-na os uivos dos lobos urbanos, quer dizer, dos cachorros, e ela vai e vai e vai… Como se a calçada fosse um mar, ela flutuando, os sapatos ainda meio mal postos, a camisa ainda meio mal colocada, o casaco por cima just in case, e ela vai e vai e vai… Logo não é mais apenas música que a guia, mas também cheiro, e ela logo deixa de ser humana, e se sente bicho, sente os pelos arrepiarem, os instintos se guerreando aquecendo a pele por dentro, o sexo, o sexo, o sexo; sexo, sexo, sexo; sexo sexo sexo; sexosexosexo; sexo. Malditos ferormônios, ela pensa, um instante antes de se deixar ir, tomada que está, incapaz de resistir, já não é mais mulher, é besta, é fera, é garra, é deusa. É, finalmente, mulher.
Um gemido.
Ah.
Ahhh.
Ahn.
AH -
- - - (ah!)
Ah!.
Ninguém sabe que, chegada a noite, a dona Prosa vai ter com a Poesia. Nós somos seus filhos, seus bastardos. Temos duas mães, perdidamente apaixonadas, eternas amantes, a inveja de Zeus.
Nós, os fazedores de sexo.
26 de setembro de 2014
Assenhorando-se de si
É bem raro estarmos tomados por apenas um sentimento. Em geral há uma multidão deles, confusos e embaralhados, brigando entre si por expressão - como se desejassem ganhar materialidade na forma de palavra ou gesto. Que indesejável não deve ser a existência silenciosa e subordinada que a maioria deles leva em nosso interior! Mas não lhes tenhamos pena. Bom jardineiro não pode ter em igual estima a flor e a erva-daninha. Confrontados com a possibilidade de cultivar um sentimento em detrimento de outro, devemos aprender a ser cruéis - é uma questão de estilo e de saúde.
Em quase todos, são a conveniência e o costume que escolhem de que sentimento permitir a expressão. Mas, para os poucos a quem isso soa insuportável, um conselho:
entre a raiva e a culpa, sempre a raiva.
21 de setembro de 2014
Mesmo que X seja vermelho, a vermelhidão de X nunca terá cor
Poucas coisas são tão enormes quanto a nossa pequenez.
Saudade de chão
A parte ruim de crescer é ver seus amigos ficando pra trás. É insuportável permanecer na presença de crianças assim. Depois vêm ídolos, professores, pais e, finalmente, deuses. Não imaginávamos, no começo da escalada, a solidão do cume: é preciso aprender a olhar com outros olhos - a amar mais de longe - a tirar prazer da companhia de outras aves. E nunca, jamais: sentir vergonha de nossas asas.
19 de setembro de 2014
Sexo, pensamento e temporalidade
Textos, principalmente as máximas e os aforismos, são ejaculações - vêm e vão em menos de trinta segundos. Mas quem já gozou sabe: duram anos e anos.
Propaganda eleitoral gratuita
Há, entre os que defendem nossa posição, quem a defenda por torpeza, tolice e até maldade. Isso não a torna -- nem torpe, nem tola, nem má. E mais: mesmo que nossa posição fosse torpe, tola ou má, disso não decorreria - não automaticamente - sermos nós mesmos torpes, tolos ou maus.
Mas quem tem tempo para tais distinções? Só temos trinta segundos. Só temos trinta segundos!
Só temos trinta segundos?
Criações nossas
Sobre algumas coisas é necessário falar, não porque existem e por isso urgem - mas porque urge fazê-las existir.
10 de setembro de 2014
Por falta de coragem
Brochar não é nada. Impotência mesmo é não ter conseguido dizer Eu te amo a tempo.
Todo amor é pra sempre
Na verdade, é provável que “para sempre” tenha sido inventado justamente para dar conta de responder a algum engraçadinho que resolveu perguntar: “Até quando vai o amor?”.
O amor vai pra sempre. Sempre.
nem todas as lágrimas nos pertencem
O amor faz com que a gente sinta o outro em nós. Faz com que a primeira pessoa do plural faça sentido. Sentimo-nos mais que um. Duas almas nos habitam o corpo. É bem terrível quando um amor morre. Mas poderia ser pior -
- ele poderia ter se suicidado.
16 de agosto de 2014
Mais nudez, por favor
Mesquinhez, sim!
Os argumentos, como os socos, têm na raiva seu melhor combustível. De nenhum filósofo a Paz é musa.
Perdendo a vergonha (de nossas cagadas)
Às vezes é preciso escrever maus textos. Grandes plantas nascem de terras adubadas com merda.
Antes quase-morto que semi-vivo!
Você já suou de tristeza?
Não subestimemos o esforço físico que é necessário para que nossa sensibilidade alcance os níveis elevados que lhe são próprios.
O apaixonado dorme como anjo, porque passa o dia cansado. Não há sistema imune que nos defenda de nossos afetos; somos, frente a eles, eternos enfermos.
O que a maioria não percebe é que a doença é desejável. O que não toleramos é a dor e a falta de controle.
Mas não são a dor e a falta de controle –- componentes do amor?
Sim. O amor é uma doença.
10 de agosto de 2014
Caminhos tortos são mais arborizados – as árvores os entortaram!
21 de julho de 2014
Nós, da tribo Osqueapesarde
Só sente verdadeiro medo diante das regras quem acredita que elas têm verdadeiro poder.
Mas o poder das regras é pequeno e limitado – pequeno e limitado é o medo que devemos sentir diante delas.
13 de junho de 2014
Canto solitário
25 de março de 2014
Seres sobrecorporais
Por que os filósofos sofrem tanto? Sua potência e saúde operam de maneira muito específica – no pensamento. E sobre a maioria das coisas não podemos pensar. Isso significa que, sobre a maioria das coisas, os filósofos sofrem.
Por sorte, as coisas sobre as quais não pensamos, fazem-nos pensar.
E as coisas que pensamos, fazem-nos sobrepensar.
22 de março de 2014
21 de março de 2014
Álbum de Fotos
‘O legal de ter fotos suas’, disseram-me uma vez, ‘é poder ver o quanto você mudou com o tempo’. Enquanto que eu não consigo discordar disso, a verdade é que a quantidade de fotos em que eu apareço não aumentou significativamente nos últimos tempos. Encontrei, no entanto, uma ferramenta muito mais adequada para medir, com todos os prazeres e desprazeres aí acarretados, os efeitos do tempo sobre mim. Bem-vindos ao meu blog. O mais preciso dos álbuns de fotos que eu poderia ter. De fato, ao reler meus textos antigos, não raro eu percebo, aqui e ali, umas gordurinhas extras, um afinamento do nariz, uma mudança de postura, um endireitar das pernas, uma ritmização dos movimentos, um choro enfeiante, um sorriso sexy, uma época bem vestido, outra em que eu corro como esportista, o meu pênis crescendo, o meu cabelo pendulando ora enorme ora curto demais, meu peito se abrindo, minhas unhas se afiando, meus pés ganhando calos, minhas mãos se cansando da letra cursiva, um intestino feliz, uma semana vegetariana, o efeito dos cremes anti-espinha, o meu primeiro (e o meu segundo) porre, a minha adolescência chegando e depois indo embora… Creio, enfim, não haver sequer um atributo físico meu que não possa ser inferido de meus textos.
10 de fevereiro de 2014
Após o luto
Ele não foi o primeiro e não será o último. É tempo de dar solidez à nossa atuação política. É tempo de tomar decisões difíceis. É tempo de organizar a revolta interna e investir energia em projetos, bandeiras e pautas. A todos nós, que julgamos o Brasil morto, adormecido, doente - que julgamos a classe política morta, adormecida, doente - que julgamos os nossos valores mortos, adormecidos, doentes - que julgamos nosso futuro morto, adormecido, doente ---- É tempo de sair do luto, e dar início a uma vida nova.