22 de dezembro de 2012

O maior de todos os tédios

“Eu não compreendo… Digamos, então, que eu faça como você diz. Que eu guarde para mim o direito de tratar a vida com escárnio, que eu ria das ilusões de grandeza dos homens, que eu me esforce por enxergar as escolhas do cotidiano, que eu me torne meu próprio senhor – não por escravizar uma parte de mim, mas precisamente por alforriar aquela que sempre se manteve enjaulada –, que eu me torne mais forte e que eu também busque fortalecer aos outros, que eu repare nas minhas egocentrias e passe a brincar com elas, que eu borre a fronteira entre o que é espetáculo e o que é vida, que eu me permita divertir com a minha pequenez, que eu descanse muito, que eu morda e arranhe e espanque, que eu me torne mais livre, que eu me torne mais homem. O que há de ocorrer então? Tendo que fim em vista você propõe todas essas coisas? O que há de sobrar do homem que o seguir? Que fará ele quando chegar ao topo dessa montanha?”

“Meu caro, é preciso dizer que uma parte de mim é absolutamente solidária ao seu questionamento, e eu preciso, sim, elogiar a sua imaginação, que a tantos nesse mundo falta e cuja ausência tanto impede a capacidade de pensar. Mas seria muito mais certeiro eu admitir, não a minha simpatia pela sua pergunta, mas o meu desapreço por ela – porque, de fato, pouco me importam os fins. Apraz-me infinitamente mais estudar os meios e os modos – o estilo! Creio termos sido todos mal educados na nossa estima pelos fins, mas isso é papo para depois. Farei, agora, o possível para responder-lhe o mais na sua língua possível. De outro modo, afinal, seria contraditório.

Quando me esforço por imaginar esse homem a que nos referimos, quando me esforço por imaginar os fins desse homem, pouco encontro. Consigo imaginá-lo, por exemplo, num descanso crescentemente intenso, um homem cujas rugas lentamente tomam conta da cara, o seu corpo - já completamente doado à vida - lenta mas ferozmente se tornando pó. São decerto sombrias as imagens que me aparecem! Mas não faz sentido que um homem que absorva tanta luz do mundo não se torne, com isso, um pouco mais escuro? Pois, se me esforço um pouco mais a imaginar o fim desse homem, logo vejo que não é feito de sombras. Esse homem, que por tanto tempo aprendeu a deixar entrar luz em si, há de encontrar uma forma suficientemente adequada para fazê-la sair! Todos os grandes homens se tornam educadores da humanidade! A sua finalidade é externa: ele escreverá um livro, ou comporá alguns poemas, ou iniciará uma passeata – ele irá terminar de se doar. E, se ainda assim ele se entedia, se ainda assim ele consegue absorver muito mais luz do que consegue dar conta de refletir, ah meu amigo!, aí sim esse homem terá a maior chance de sua vida, sua maior provação; lá, onde todas as tarefas são insuficientes, onde não há trabalho grandioso o suficiente para preenchê-lo, quando a natureza efetivamente lhe prega uma peça e como que diz: – Aquilo que eu lhe dei antes como hercúleo dever era meramente um preâmbulo ao que vem pela frente! Aí, meu caro amigo, esse homem se tornará pai.”

Um comentário:

  1. Esse texto é quase mt bom. Quase. Vc vai me xingar outra vez, mas eu acho que ele era boa ideia que deu errado. O final parece bem escolhido, mas acho q faltou aquele "vigor penetrante".

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