27 de fevereiro de 2017

Mais um esquecimento

Quem dedica a alma por muito tempo ao pensamento com freqüência esquece aquela sensação da infância de pensar sem um centro, como manivela que não está presa a nada mas que ainda assim gira desconstrangida e leve. Como queremos mudar o mundo, ao crescermos insistimos em prender nosso pensamento a uma base, para que ao rodá-lo sintamos que nossos esforços movem algo lá fora. Epistemologias inteiras escrevemos em busca desse centro, dessa base de manivela segura o bastante para que o mundo seja com ela manejado. Ao ficarem gagás, como invariavelmente acontece, os cientistas experimentam intensa alegria, pois finalmente podem usar suas manivelas (que poliram durante toda a vida e que tão habilmente seguram) sem atá-las ao que quer que seja: tornam-se livres, como crianças, pois fazem o que amam — pensam — sem o peso de outrora e tudo, tudo parece agora girar com a manivela e são por isso corretamente chamados de loucos. A manivela que tudo gira é tão útil quanto a palavra que tudo significa (pensar é discriminar). Como é linda e como é assustadora e como é patética essa imagem do cientista gagá que se perde, cansado demais de procurar bases e centros e seguranças e métodos. Recomenda-se, para prevenir esse destino, eventuais mergulhos nessa irresponsabilidade mental, o entregar-se ao pensamento sem o lá-fora, uma espécie de meditação do intelecto. Nosso objetivo é reganharmos o contato com a alegria da infância sem no entanto perder o que aprendemos, sem nos tornarmos impotentes, sem nos tornarmos cientistas malucos. Conseguiremos.

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